Desculpa esfarrapada

Desculpa esfarrapada

Em uma era surreal, eu estava assistindo a uma convenção de um partido, que lançava a candidatura de determinado alcaide. Um dos correligionários resolveu discursar. Falou bastante. Depois,para justificar os atentados involuntários às normas da língua de Camões, saiu-se com esta:

- Pessuá, mim discurpe por não falá bem... É que só fiz o sigundo grá.

Pus-me a pensar: As pessoas que fazem o segundo grau têm esse nível de discurso?

O orador, que acabava de golpear gravemente a gramática do vernáculo, feriu de morte o ensino brasileiro, que deixa as pessoas chegarem ao fim do segundo grau sem conhecer o suficiente de sua língua materna.

Isso me deu uma ideia para a educação brasileira: Substituir o excesso de conteúdo inútil por um conjunto de conhecimentos realmente necessários à vida do estudante. Afinal de contas, não se justifica o aluno chegar na escola, passar nove anos no ensino fundamental e três anos no médio e não saber falar a língua que escuta em casa o dia todo, que está impregnada em tudo que se faz... Pra onde olhamos, a linguagem estará lá. Aliás, se não fosse o código linguístico, eu nem estaria aqui, diante do teclado, digitando letras, sílabas, palavras, frases, períodos e textos. Eu estaria enviando sinais de fumaça! Se não fosse a linguagem, a humanidade não teria chegado a um nível de progresso tão significativo.
No princípio era o Logos, ou a palavra. Tudo que existe no mundo nasceu da palavra. E cada vez que o homem cria um artefato, nova palavra é inventada, para dar-lhe nome.
Sem o idioma, estaríamos na idade da pedra lascada.
Portanto, meu correligionário, se você estudou no primeiro e concluiu o segundo grau, há pelo menos uma coisa que você não estudou bem: A Língua Portuguesa, a "Última flor do Láscio inculta e bela, a um tempo esplendor e sepultura"*!

* Trecho da poesia "LÍNGUA PORTUGUESA",que por achar muito bela, transacrevo abaixo:

LÍNGUA PORTUGUESA
Olavo Bilac

Última flor do lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo-te (Amo o teu viço e o teu aroma)
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "Meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!



Despeço-me enviando um grande abraço a todos os meus estimados leitores.